A derrubada de árvores na floresta
amazônica por exploração convencional, legal ou ilegal, e sua
transformação em tábuas, vigas, pranchas e outros formatos de madeiras
serradas utilizadas na construção civil é responsável por algo entre 6,5
e 24,9 toneladas de dióxido de carbono (CO2) por metro cúbico de
madeira serrada. Essa estimativa é uma das conclusões da dissertação de
mestrado Emissão de CO2 da madeira serrada da Amazônia: o caso da
exploração convencional, que foi realizada pela arquiteta Érica Ferraz
de Campos na Escola Politécnica (Poli) da USP, sob orientação do
professor Vanderley John. O estudo supera os levantamentos do gênero
feitos até agora, uma vez que espelha a emissão de CO2 ao longo de todo o
processo de produção da madeira serrada, do corte de toras até o seu
transporte para o mercado consumidor.
O CO2 é um dos gases de efeito estufa e
tem papel importante nas mudanças climáticas. Daí a relevância desta
pesquisa, que foi baseada em dados de literatura e levantamentos feitos
com empresas madeireiras, estes obtidos por meio de uma pesquisa de
doutorado da arquiteta Katia Punhagui, que vem sendo desenvolvida no
mesmo grupo de pesquisas da Poli.
Para chegar a essa conclusão, a
pesquisadora analisou o processo produtivo da madeira serrada na
Amazônia, isto é, a transformação das toras em tábuas, por exemplo. “Ele
é constituído por quatro etapas: extração das árvores, deslocamento
delas entre a floresta e a serraria, processamento das toras em produtos
serrados e transporte delas ao mercado consumidor, com diferentes graus
de impacto ambiental em cada uma”, explica. “Ao longo dessas etapas, o
carbono é liberado principalmente como CO2, a partir da degradação de
resíduos de biomassa, gerados na extração e no processamento, e da
queima de energia fóssil.”
Segundo Érica, em cada hectare da
floresta amazônica há entre 200 e 425 (média de 300) toneladas de
biomassa seca (madeira livre de água, seca em estufa), que estocam de 98
a 208 (média de 147) toneladas de carbono. “Na exploração convencional,
sem manejo, são extraídas de 3 a 9 árvores por hectare, o que
representa entre 4% e 14% da biomassa dessa área”, conta. “Durante essa
primeira etapa do processo, pode ser danificada de 7% a 33% da biomassa
florestal para abertura de trilhas, derrubada e retirada da madeira
comercial. Essa variação está principalmente relacionada à densidade da
vegetação na floresta e procedimentos adotados pelo madeireiro. São
resíduos como árvores destruídas, troncos quebrados ou ocos, pedaços de
madeira sem aproveitamento comercial, galhos de pequeno diâmetro e
folhas, por exemplo, que são abandonados na floresta, onde se decompõe,
liberando CO2 para a atmosfera.”
Outras fontes de CO2
Na
segunda etapa do processo, que ocorre nas serrarias, devido ao baixo
aproveitamento delas, pelo menos 54% da biomassa das toras são
transformados em resíduos, como pedaços de madeira, cascas, aparas e pó
de serragem, que são queimados ou se degradam, transformando-se em outra
fonte de CO2. Além disso, em toda a cadeia produtiva, é consumida
energia fóssil, principalmente óleo diesel, para funcionamento de
equipamentos, como motosserras, tratores, maquinário de processamento
das toras e veículos de transporte, que levam as toras da floresta até
as serrarias. É a terceira etapa, na qual também é liberado CO2,
resultante da demanda energética.
Somando tudo, Érica estimou
que, no total, esse processo produtivo libera entre 7,5 e 28,4 toneladas
de dióxido de carbono por tonelada seca de madeira serrada. A esse
valor,
deve-se acrescentar o que é liberado na quarta etapa, que é transporte
do produto entre a serraria e o mercado consumidor. Considerando-se a
distância média percorrida legalmente com a madeira amazônica no Brasil,
que foi estimada em 1.956 km, essa etapa libera mais algo entre 0,03 e
0,12 tonelada de CO2 por tonelada de tora processada.
Diante
desses dados, Érica diz que o impacto da madeira amazônica serrada não
pode ser desprezado, mesmo em casos de exploração legal. Extrapolando os
dados de emissão unitária de CO2 para a quantidade de madeira
consumida, estimamos que essa atividade pode ter representado entre 3,5%
e 13,1% do total das emissões brasileiras de dióxido carbono (CO2) em
2005.
Para ela, o modelo convencional de exploração tem que ser
revisto. “Políticas públicas, incentivos de mercado e iniciativas de
mitigação precisam ser criadas com urgência, tanto para minimizar a
liberação de CO2, como para promover a conservação da floresta”,
defende. “Mas para isso são necessários mais estudos, principalmente que
levantem dados da exploração manejada da floresta Amazônica, com o
objetivo de medir e detalhar a contribuição de cada etapa do processo
produtivo com maior exatidão, além de caracterizar a madeira de áreas
com diferentes composições de vegetação e para diferentes modelos de
exploração.” Na sua avaliação, informações sobre o impacto dos diversos
materiais de construção são fundamentais para profissionais e
consumidores gerenciarem a sustentabilidade no setor. “No caso do CO2,
os dados podem ser incorporados em inventários de carbono de edifícios”,
finaliza.
Fonte:
Agência USP